segunda-feira, 20 de junho de 2011

Saudosos de Carlos Drummond de Andrade

Lembro-me da primeira poesia que escrevi quando era mais novo, por volta do final do ensino fundamental ou início do médio. Imediatamente após escrevê-la fechei o caderno em ímpeto, como que assegurando seu anonimato. Naqueles dias, sempre que versos brotavam em minha mente, indagava se mais alguém ao meu redor possuía tais anseios. Não sei bem se me envergonhava de entrar em contato com meus sentimentos ou de pôr-me a escrever sobre eles, não sei nem ao certo se havia vergonha de fato, mas lembro bem que gostaria de saber como os grandes poetas se retiraram da confortável quietude da inércia e arriscaram seus pensamentos ao mundo pela primeira vez. Será que experienciaram grande medo? Sempre souberam refazer-se das críticas e menosprezos? Com o tempo, aprendi que invariavelmente as respostas eram sim e não respectivamente, mas mesmo assim, ali estavam eles imortalizados nas páginas dos livros, cada um responsável por inúmeros poemas escritos com sabedoria e sensibilidade. Suas determinações inspiraram outros, eu dentre eles, a dar ouvidos às suas vozes internas.
Não deixaria de ser verdade no entanto que às vezes acho que esta forma de relação com a vida se perdeu. O olhar do outro sempre foi algo pesado, mas nos tempos atuais alastra-se como fogo em vales uivantes, logo hoje quando o dom da palavra parece caracterizar esnobes intelectualizados. Triste inversão de valores. Quando leio Carlos Drummond de Andrade penso comigo mesmo: “Pena as pessoas não falarem mais assim.”
Deparei-me em minha estante com um livro deste que foi um dos mais sensíveis poetas brasileiros e me veio, como em épocas outras, o ímpeto. Mas desta vez, o ímpeto de escancarar o caderno do adolescente quem sabe envergonhado.

Ela

Das névoas de meus sonhos
Uma imagem, à tona se apresenta
Alucinação de meu inconsciente
Representação de meu futuro

Instantes onde mal posso enxergar
Os contornos de sua terna face
As linhas que definem sua beleza
Todavia, gravadas em minha mente

Beleza esta não comum, rígida ou extravagante
Mas sutil, doce, como um intocável luar
Repleto de energia e fulgor
Embora desconhecido e oculto

Dádivas a um mero sonhador
Conduzidas pelo ar, pela terra
Pelos caminhos que indicam
Sinais de uma futura paixão

Venero-a como ao desconhecido
Posto que continuo em sua busca
Ávido, meu coração se fortalece
Ao sentir seu perfume, sua doçura

Pela eternidade serei seu
E apenas seu, meu amor será
Aguardo-a ansiosamente
Procuro-a pacientemente

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